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educação diferente

EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E DEFICIÊNCIA

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EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E DEFICIÊNCIA

Projecto de Intervenção para Alunos Multideficientes (número 2)

Competências comunicativas a desenvolver

Na criança com multideficiência o professor/educador deve delinear as competências comunicativas a desenvolver tendo em conta as suas capacidades comunicativas, assim como as interacções sociais a que esta está sujeita.

De uma forma geral o educador deverá procurar elevar o nível das capacidades comunicativas e ampliar o número e a qualidade das interacções sociais.

Como tal, é imperioso conhecer a forma como a criança interage socialmente (com pares e adultos), uma vez que é com base no estabelecimento de uma boa relação afectiva que a criança explorará o ambiente com maior segurança. Também é importante que o professor/educador conheça a forma como a criança comunica os seus desejos, necessidades, etc.

Relativamente à interacção social, o professor/educador deve verificar se a criança consegue “pegar a vez”; apurar quantos turnos é capaz de tomar antes de se desinteressar da acção; ver se acriança consegue iniciar, manter e terminar uma interacção; quais os parceiros com quem interage.

No que diz respeito à comunicação, deve observar se a criança demonstra intenção comunicativa; quais as formas que utiliza para receber e expressar informação; quais as razões porque comunica; se é capaz de efectuar uma escolha.

É necessário criar oportunidades comunicativas para que a criança com multideficiência possa comunicar, assim como é importante que esta sinta necessidade de comunicar.

 

Estratégias, actividades e materiais para desenvolver a capacidade comunicativa

 

As actividades devem visar o desenvolvimento da comunicação e a formação de conceitos, a fim de serem partilhados com adultos e pares.

Esta intervenção deve ocorrer em contextos naturais. Devem então, aproveitar-se as oportunidades naturais e inserir outras nas actividades que a criança multideficiente desenvolve.

De seguida apresentamos algumas estratégias que envolvem actividades e materiais que procuram desenvolver a comunicação receptiva e expressiva.

Pistas de informação

As pistas de informação são formas de comunicação receptiva que procuram desenvolver na criança a capacidade de antecipar o que vai acontecer. Têm também por objectivo dar informações específicas que apoiem as interacções estabelecidas entre a criança e os parceiros de comunicação, assim como desenvolver as competências de comunicação receptiva, desenvolvendo o sentimento de segurança.

 

Exemplos de pistas naturais ou de contexto (fazem parte do ambiente natural da criança):

- a água da torneira a correr poderá indicar que está na hora do banho;

- o cheiro da comida poderá indicar que está na hora do almoço;

- o cheiro do frasco do champô poderá indicar para lavar a cabeça.

 

Exemplos de pistas de movimento (são movimentos executados em conjunto com a criança):

- balouçar a criança para lhe dizer que vai andar de balouço;

- pegar-lhe no braço levemente e fazer com ela o movimento de levar a colher à boca, indicando que vai comer;

- pegar nos braços devagar e elevá-los acima da cabeça para indicar que vai tirar a camisola;

- fazer o movimento de nadar com os braços para indicar a entrada na piscina.

 

Exemplos de pistas tácteis (são apresentadas à criança através do toque):

- tocar na zona da axila da criança para que esta se levante;

- fazer pressão sobre os seus ombros para dizer que deve sentar-se;

- tocar no pé da criança para que esta calce o sapato.

 

Exemplos de pistas de objectos (pode ser um objecto ou parte deste e é usado para dar informação à criança):

Com objectos reais:

- a colher poderá ser utilizada para indicar a hora do almoço;

- a mochila pode ser usada para indicar que está na hora de ir para casa;

- uma poderá ser utilizada para indicar que vai começar a aula de psicomotricidade.

Com partes de objectos:

- um pedaço de uma embalagem de um chocolate para saber se quer comer chocolate;

- uma tampa de caneta de feltro poderá indicar que vai pintar;

- a tampa de um iogurte pode ajudar a compreender que vai comer iogurte.

Exemplos de pistas gestuais (são gestos que se fazem dentro do campo visual da criança):

- fazer o gesto que “não” com a cabeça;

- fazer gesto de comer para dar a informação de que está na hora do almoço;
- fazer o gesto para indicar que a actividade acabou.

 

Exemplos de pistas de imagens (são contornos de objectos, desenhos, fotos, símbolos gráficos que podem representar acções, pessoas, locais, etc.):

- a fotografia de um lavatório poderá indicar À criança que deve lavar as mãos;

- um símbolo gráfico pode dar informação à criança de uma tarefa a realizar;

- a fotografia do professor de psicomotricidade poderá indicar que vai começar a aula.

 

Para avaliarmos o grau de implementação das pistas de informação e o desenvolvimento da criança poderemos construir grelhas que nos permitam registar as evoluções verificadas (exemplo de uma grelha de avaliação):

 

Objectos de referência

A utilização de objectos de referência é uma das possíveis estratégias a usar para ajudar a criança com multideficiência a desenvolver competências comunicativas que lhe permita manifestar preferências, gostos, sentimentos e necessidades. Uma vez que estas crianças se expressa através de formas de comunicação não verbal.

Os objectos de referência ajudam também a criança a fazer a transição das formas de comunicação não simbólicas para simbólicas, assim como auxiliam na compreensão do ambiente que as rodeia.

A escolha dos objectos de referência deve ter em conta: o tamanho, espessura, contraste, motivação da criança, local a escolher, assim como as capacidades da criança.

 

Os objectos de referência podem ser:

- reais – objectos utilizados nas actividades e que representam uma acção, pessoa ou um evento, por exemplo:

- garrafa de água para representar a acção “beber”; 

- bola para representar a acção “jogar”;

 - sapato para representar a acção “calçar”.

 

- partes de um objecto – partes de objectos utilizados nas actividades e que representam uma acção, pessoa ou um evento, por exemplo:

- um pedaço de lençol para representar a “hora de dormir”;

- uma parte do cinto de segurança de um carro pode representar “ir andar de carro”;

- uma tampa de um iogurte pode representar “comer”.

 

- objectos associados – são objectos que embora não sejam utilizados na actividade realizada pela criança, representam-na por serem idênticos, por exemplo:

- qualquer boné pode representar uma ida à rua;

- qualquer copo pode representar a acção “beber”;

- qualquer talher pode representar a acção “comer”.

 

Sugestões de utilização de objectos de referência:

- criar caixas de objectos iguais (pentes, copos, pratos...) com diferentes características (diferentes tamanhos, formas, cores...);

- ter cestos com diferentes objectos, para que a criança exprima através da selecção destes, os seus desejos e preferências;

- utilizar objectos de referência em conjunto com símbolos gráficos e com palavras escritas;

- construir calendários de actividades com objectos reais;

- criar dispositivos com objectos de referência para escolher, por exemplo o que quer lanchar;

- fazer quadros, livros, tabuleiros e dispositivos onde se coloquem objectos de referência;

- reduzir e ampliar o tamanho e a espessura objectos de referência;

- seleccionar objectos que contrastem fortemente em termos da textura, da forma, da cor e do respectivo significado, a fim de facilitar a compreensão;

- ter em conta as preferências e o grau de motivação da criança;

- simplificar a utilização de objectos de referência, ou seja perceber quais as características mais significativas para a criança (possibilitando uma fácil utilização e o acesso a níveis cognitivos mais elaborados);

- seleccionar objectos de referência que sejam significativos, atractivos e facilmente reconhecidos;

- utilizar os objectos de referência nas actividades naturais mais significativas para a criança;

- introduzir um objecto de cada vez para representar uma acção (progressivamente podem ser introduzidos mais objectos);

- encorajar a utilização dos objectos de referência, assim que a criança esteja familiarizada com a compreensão da informação;

- utilizar os objectos de referência em conjunto com tecnologias de apoio, como por exemplo com digitalizadores da fala;

- Aumentar progressivamente o vocabulário receptivo e expressivo da criança estimulando-a a seleccionar novos objectos de referência e a respectiva atribuição de significado;

- usar os objectos de referência de forma sistemática e consistente pelos profissionais que trabalham com a criança e pelos encarregados de educação, avaliando e reestruturando sempre que necessário.

 

Calendários

Os calendários são constituídos por símbolos que estão organizados de forma sequencial e que representam actividades a realizar, auxiliando a criança com multideficiência a compreender o que vai fazer.

Os símbolos utilizados no calendário podem ser palavras, imagens ou objectos e a sua escolha depende das capacidades visuais e cognitivas da criança.

Antes de se utilizar este sistema é necessário estabelecer rotinas diárias e conhecer as capacidades comunicativas, visuais, motoras e cognitivas da criança.

Existem vários tipos de calendários:

Calendário de antecipação – permite à criança antecipar os eventos ou as actividades que vão acontecer a seguir.

Calendário diário – permite à criança conhecer as actividades que vai desenvolver ao longo do dia.

Calendário semanal – permite à criança conhecer as actividades que vai desenvolver ao longo da semana.

Calendário mensal – permite à criança conhecer as actividades que vai desenvolver ao longo do mês.

Agenda – permite à criança conhecer as actividades que vai desenvolver ao longo de um conjunto de meses, período ou semestre.

 

Sugestões relativas ao uso de calendários:

- utilizar os calendários em vários ambientes (salas de aula, ginásio, casa...);

- conversar com a criança acerca das actividades organizadas sequencialmente;

- explicar que as actividades se realizam umas a seguir às outras;

- aumentar gradualmente a quantidade de actividades expostas no calendário;

- criar oportunidades, sempre que possível, para que a criança seleccione o objecto que deverá representar a actividade;

- utilizar o calendário para explicar a razão de determinada actividade não se realizar;

- adicionar informação em relação à actividade (por exemplo: local, com quem...);

- usar o calendário para despertar a curiosidade da criança, introduzindo novos  tópicos para simbolizar novas actividades;

- utilizar o calendário para fazer perguntas, comentários, pedidos, etc. acerca das actividades realizadas.

 

Interacções comunicativas

As interacções comunicativas ocorrem na relação com os outros, baseadas em tópicos provenientes de experiências. Torna-se então necessário promover à criança com multideficiência oportunidades para estabelecer interacções comunicativas, as quais devem ser desenvolvidas nas actividades da vida diária.

 

Estratégias para desenvolver as interacções comunicativas:

- promover interacções significativas para a criança a fim de desenvolver o “pegar a vez”;

- procurar desenvolver actividades que envolvam alternância de turnos (quer sejam de interacção social ou que envolvam conteúdos) que incluam a atenção sobre os objectos, de forma a criar oportunidades de aprendizagem nas interacções que se estabelecem com a criança;

- reconhecer na criança os comportamentos potencialmente comunicativos e seleccionar aqueles que possam ser úteis para a envolver activamente nas interacções e responder-lhes adequadamente;

- responder aos comportamentos utilizando formas de comunicação que correspondam ao nível de compreensão da criança;

- proporcionar oportunidades para que a criança possa iniciar uma conversa (para chamar a atenção, pedir algo, partilhar informação...);

- seleccionar dentro das actividades os tópicos (motivadores para a criança) de conversa e ter em conta que não é possível falar acerca de tudo o eu existe no ambiente;

- dar tempo à criança para que esta responda;

- construir: livros de comunicação, dispositivos de comunicação, assim como usar tecnologias de apoio;

- ensinar à criança sinais indicadores do inicio e fim de uma conversa (por exemplo: desviar a atenção ou introduzir outro tópico);

- focalizar a interacção nas actividades que a criança consegue fazer, a fim de desenvolver a capacidade comunicativa;

- mostrar à criança respeito, para que esta confie no interlocutor e saiba que este respeita as suas capacidades;

- aproximar-se da criança, tocar-lhe, sorrir próximo dela, para promover o bem estar emocional da mesma;

- ter em conta o posicionamento da criança, de forma confortável e a fim de possibilitar a interacção com o parceiro;

- demonstrar à criança, através de um posicionamento próximo, disponibilidade para a interacção comunicativa;

- utilizar objectos e movimentos como tópicos para auxiliar no estabelecimento de uma conversa;

- acompanhar sempre a linguagem oral com outras forma de comunicação, como por exemplo: expressões, objectos, gestos, imagens...;

- falar de uma forma clara e com um ritmo calmo;

- verbalizar o que a criança procura dizer;

- utilizar frases curtas e fazer pausas frequentes, para que a criança processe a informação.

 

Avaliação

Inicialmente o professor/educador deverá recolher alguma informação prévia acerca do percurso educativo, os aspectos clínicos, ambiente escolar e das necessidades e prioridades da família.

Após esta recolha de informação, deverá analisar toda a informação recolhida, no sentido de decidir o que pretende avaliar, quais as actividades, em que ambientes, quem vai avaliar, quando, quais os materiais e os instrumentos a usar.

A avaliação deve centrar-se nas actividades realizadas, avaliando: as capacidades e as necessidades da criança com multideficiência e a forma como funciona nas actividades.

Deve ainda ser avaliado o modo como as actividades decorrem, as prioridades da família e da equipa multidisciplinar e das dificuldades existentes.

Desta forma, o professor/educador poderá obter informação que permitirá compreender as competências e as necessidades da criança, como funciona nos diferentes ambientes e contextos. No sentido de tomar decisões relativas à planificação da intervenção, tendo como principal objectivo o funcionamento da criança multideficiente no futuro.

 

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