Aprender com Multideficiência Através da Brincadeira
Introdução
O jogo é uma actividade de carácter básico para a criança e é sem dúvida uma forma natural de interagir com os objectos, com as pessoas e com o mundo. Ao nível da educação o jogo constitui para a criança, uma forma bastante eficaz de desenvolvimento das suas características cognitivas, motoras e sócio-afectivas através de experiências com o meio envolvente.
Jogando a criança aprende que pode controlar o ambiente que a rodeia e ao mesmo tempo fazer parte dele (desenvolvendo competências interactivas com os objectos/materiais e com as pessoas).
O jogo desempenha um papel de extrema importância na aprendizagem das crianças multideficientes. As crianças multideficientes necessitam de uma atenção especial por pertencerem a um grupo heterogéneo com características bastante específicas.
A multideficiência não é mais do que uma combinação de deficiências (auditivas, visuais, motoras, cognitivas, etc.) e a inclusão de crianças multideficientes no sistema de ensino é um desafio para professores, educadores, psicólogos e restantes técnicos.
Os brinquedos são materiais lúdicos e pedagógicos que desempenham nestas crianças um papel recreativo e terapêutico. Para além disto, servem de instrumentos ao Processo Ensino-Aprendizagem auxiliando no desenvolvimento das capacidades cognitivas, motoras e sócio-afectivas.
Aprender com Multideficiência Através da Brincadeira
Processo Ensino-Aprendizagem:
Se o jogo for bem organizado e estruturado pelo professor/educador e se houver uma utilização adequada dos diferentes brinquedos/objectos (tendo em conta as capacidades da criança e as metas delineadas) a criança terá provavelmente condições para um desenvolvimento mais eficaz ao nível da comunicação, autonomia, cognição, etc.
O Processo Ensino-Aprendizagem deve proporcionar actividades de carácter diversificado, em que a criança seja um elemento activo.
Para isso o professor/educador necessita de efectuar um trabalho exaustivo de análise, observação e de avaliação a fim de conhecer as capacidades da criança, as suas limitações e a forma como aprende. De forma a delinear metas e objectivos a atingir, assim como proporcionar um ambiente de aprendizagem com as melhores condições.
Condições Essenciais à Aprendizagem:
-Ter um ambiente calmo adequado às suas necessidades e características;
-Colocar os objectos acessíveis à criança;
-Eliminar barreiras arquitectónicas;
-Estar descontraída e bem alimentada;
-Apresentar uma boa higiene;
-Aprender com outras crianças;
-Explorar uma actividade ou brinquedo/objecto de diferentes maneiras;
-Ter tempo para explorar e experimentar;
-Partilhar interesses e experiências;
-Receber um feedback do adulto no momento próprio;
-Etc.
Papel do Professor/Educador:
O papel do professor/educador é importante no sentido de proporcionar à criança diferentes oportunidades de aprendizagem através da diversidade da utilização de materiais, assim como partilhar com a mesma as suas experiências. Este deve facilitar a aprendizagem, deixando que a criança participe de uma forma mais activa através do jogo e da brincadeira.
Estratégias que Promovam a Aprendizagem:
-Criação de vários centros de actividades dentro da sala de aula;
-Apetrechar a sala de aula com equipamento seguro e de fácil acesso;
-Aquisição/construção de materiais/objectos com diferentes características;
-Promoção de oportunidades à criança de interacção com os materiais/objectos;
-Utilização de materiais/objectos que possam ser agrupados em categorias (possibilitando a comparação através da variedade de formas, cores, tamanhos, etc.);
-Etc.
A Utilização dos Brinquedos na Multideficiência Introdução:
A escolha de um brinquedo/objecto, ou até de um jogo para a criança multideficiente deve ter em conta as capacidades da criança, a forma como esta aprende (tipo/estilo de aprendizagem), assim como os objectivos a alcançar.
Os brinquedos/objectos devem ser de fácil manipulação e de fácil compreensão (de uso simples) para a criança. Devem ainda ser adequados à sua idade e às suas capacidades, devem ser interessantes e seguros.
Relacionamento dos Brinquedos/Objectos com o Funcionamento Geral da Criança e com as suas Qualidades Sensoriais:
-Estes brinquedos/objectos devem ter características similares aos das crianças normais (este pode ser um factor de interacção entre elas);
-Devem conduzir a criança à resolução de problemas e devem ajudá-la a ser activa (devem estimular o movimento, a exploração, a comunicação, a criatividade, o raciocínio);
-A sua utilização deve envolver o jogo simbólico sempre que o desenvolvimento da criança multideficiente o permita (diferentes combinações, formas, tamanhos, etc.);
-A sua manipulação deve ser interessante e significativa para a criança;
-Devem ter características que estimulem as qualidades sensoriais da criança: tácteis (objectos com diferentes texturas, texturas da sua preferência, etc.); proprioceptivas (objectos que vibrem); visuais (objectos grandes e com cores intensas, como por exemplo: amarelo, vermelho ou laranja); auditivas (objectos com sons variados).
Tipos de Objectos/Materiais a seleccionar para a Criança:
Os professores, educadores, terapeutas, restantes técnicos, e até os encarregados de educação poderão seleccionar diversos objectos de uso corrente para a criança, que poderão contribuir para o seu desenvolvimento de uma forma geral:
-Materiais de uso simples que explorem a sua criatividade (como balões, bolas, apitos, etc.);
-Objectos que permitam a exploração das suas ideias (como lápis, marcadores, folhas, plasticina, etc.);
-Mecanismos que permitam mudar a posição dos objectos (aumentando as hipóteses de exploração);
-Objectos de uso comum na vida diária (como: pratos, copos, colheres, etc.).
Algumas Estratégias para uma Melhor Adaptação aos Brinquedos/Objectos:
-Variar os materiais dos brinquedos/objectos;
-Criar espaços devidamente apetrechados e seguros;
-Utilizar velcro adesivo para ajudar a segurar objectos ao corpo e à roupa;
-Colocar um elástico à volta da mão da criança para auxiliar a sua manipulação e exploração;
-Utilize objectos com características sonoras, vibratórias, visuais e tácteis;
-Etc.
Little Room
O Little Room pode ser definido como sendo um equipamento desenhado pela Dra. Lilli Nielsen com o objectivo de proporcionar à criança um ambiente de jogo, no qual ela pode interagir com os objectos e consequentemente aprender algo acerca do mundo que a rodeia.
Este equipamento pode ser comparado a uma pequena casa, em os objectos/materiais se encontram suspensos no tecto e nas paredes laterais da mesma. Proporcionando à criança oportunidades de estabelecer relações sensoriais, assim como aprender o conceito de objecto e as suas posições no espaço.
O tamanho deste espaço poderá variar de acordo com a estatura da criança e com o local onde o mesmo será colocado. Os materiais/objectos suspensos devem ser seleccionados de acordo com o desenvolvimento da criança.
Neste local de aprendizagem os brinquedos/objectos devem possibilitar à criança a exploração livre e devem provocar acções visuais, tácteis, sonoras, vibratórias, etc. A criança necessita da repetição para poder aprender a comparar e a observar o contraste entre os objectos do Little Room e os do seu conhecimento, bem como a aprender que o mundo pode ser organizado e previsível.
De acordo com a familiarização da criança aos novos materiais/objectos, devem-se modificar/alterar os mesmos no sentido de a motivar. Com este equipamento a criança aprende a explorar e a experimentar objectos. Aprende ainda a relacionar os sons, as texturas, as formas, os pesos, as cores, etc. Desenvolvendo na criança comportamentos básicos, como: agarrar, puxar, torcer, bater, pontapear, etc.
A criança aprende a ser mais activa, fazendo com que as acções aconteçam quando recebe um feedback a partir dos seus movimentos reflexos.
Por outro lado, a utilização deste tipo de equipamento apresenta desvantagens:
-Por ser um ambiente artificial (tornando-se difícil generalizar comportamentos adquiridos);
-Os objectos/materiais deste equipamento podem estigmatizar a criança quando se encontra perto dos seus pares;
-Não deve ser utilizado durante longos períodos de tempo.
Cabe então ao professor/educador observar a criança durante a actividade a fim de registar e analisar comportamentos, de forma a poder dar-lhe uma informação verbal ou não verbal acerca da sua prestação.
Autoria: Pedro Santos (Professor)
Data: Fevereiro de 2006