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educação diferente

EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E DEFICIÊNCIA

educação diferente

EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E DEFICIÊNCIA

Comunicação Alternativa para o Aluno Multideficiente (número 1)

Introdução

           

Perspectivar a educação de alunos com multideficiência é um desafio. A especificidade das suas necessidades educativas requer técnicos com elevado nível de especialização que lhes permitam identificar as suas necessidades, garantindo respostas mais adequadas.

 

            Para que estas respostas, em contexto escolar, sejam as mais adequadas os professores precisam fazer formação na área ou então serem apoiados por técnicos especializados nas mesmas. Todavia, a atenção do professor nesta área não deverá apenas centrar-se só em actividades práticas, ele deverá, acima de tudo, trabalhar de forma a incluir as crianças multideficientes nos contextos escolares, sensibilizando os demais para a sua presença e promovendo a adaptação da criança ao contexto.

 

            Tendo em consideração a especificidade da intervenção por parte do professor junto destas crianças o trabalho que realizamos procura apresentar algumas estratégias/actividades relativas à intervenção pedagógica junto de crianças multideficientes. Esta intervenção visa promover o funcionamento destas crianças nas áreas consideradas mais relevantes, destas, no nosso trabalho salientamos a comunicação.

 

            Sendo a comunicação um instrumento de ligação entre a criança, os que a rodeiam e o mundo é necessário desenvolvê-la da melhor forma possível para ajudar a criança a comunicar e a interagir. Esta ajuda pode ser efectuada através de vários tipos de comunicação, convergindo estes na comunicação receptiva e expressiva, as quais salientaremos.

 

            No entanto, estratégias apresentadas não poderão servir de “receita”, uma vez que, tal como referem Pereira e Vieira (1996: 47, cit. por Nunes, 1992: 193) “a desvantagem sofrida por cada indivíduo é pessoal e particular; por isso, a sua educação não pode ser feita sem um ensino individualizado, centrado nas necessidades de cada um”. Assim, um professor terá sempre de se adaptar, quaisquer que sejam as estratégias seleccionadas, à criança em questão de acordo com as suas capacidades, necessidades e aptidões.

 

Esperamos com este trabalho ajudar os professores a melhorar as suas práticas, nomeadamente comunicativas, com as crianças multideficientes, uma vez que as estratégias apresentadas servem de pistas para a criação de outras mais adequadas, devendo ser efectuadas numa perspectiva funcional.

1- Enquadramento Teórico

1.1- Definição de multideficiência

 

Uma criança com multideficiência apresenta necessidades educativas especiais de carácter prolongado com acentuadas limitações no funcionamento cognitivo, associados a limitações noutros domínios, nomeadamente no domínio motor e/ou sensorial (visual e auditivo) com reflexos no desenvolvimento e aprendizagem requerendo apoio permanente.

 

Segundo Orelove e Sobsey (1991) as pessoas multidificientes são “indivíduos com atrasos mental, severo ou profundo, com uma ou mais deficiências sensoriais ou motoras e/ou necessidades de cuidados especiais”. Mais tarde, Contreras e Valência, reforçam esta definição acrescentando no entanto que a multideficiência “é o conjunto de duas ou mais incapacidades ou diminuições de ordem física, psíquica ou sensorial” (1997: 378).

 

Já para Nunes (2001: 16) a multideficiência “é mais do que a mera combinação ou associação de deficiências, constituindo um grupo muito heterogéneo entre si, apesar de apresentarem características específicas/particulares”.

 

A inclusão das crianças com características multideficientes numa turma dita “normal” representa um desafio para muitos professores que intervêm junto delas, uma vez que lhes exige um trabalho redobrado e uma actualização constante dos seus conhecimentos. Um professor que trabalhe com mutideficientes precisa ter a noção das causas desses problemas, para que os possa integrar no seu Projecto Curricular de Turma, e desse modo definir para si estratégias de trabalho que permitam o desenvolvimento da criança, de forma adequada e consciente.

 

A situação pode ser mais ou menos complexa de acordo com as combinações que os problemas da criança estabelecem entre si, uma vez que cada criança é única, podendo, deste modo, haver uma variação no tipo e grau de gravidade muito alargada. Esta variação influencia mais ou menos o desenvolvimento da criança conforme o exercício da sua interacção, sendo que estes aspectos não são meramente aditivos, mas sim interrelacionais.

 

Outro factor que influência o desenvolvimento da criança multideficiente é o ambiente e a forma como esta interage no mesmo. Se a criança se adapta com facilidade ao ambiente escolar e ao professor que com ela trabalha, o seu desenvolvimento pessoal e social será mais positivo, situação que facilitará também o trabalho do próprio professor e da turma em que a criança está inserida.

1.2 - Causas da multideficiência

 

A existência de lesões orgânicas graves reflecte-se ao nível do funcionamento do sistema nervoso central, mas também afecta outros órgãos, tais como os dos sentidos, os membros, a fala, a saúde em geral, levando a problemas tão diversificados como a epilepsia, dificuldades de alimentação, controlo dos esfíncteres, entre outros.

 

Contudo, a multideficiência não é um somatório dessas alterações mas sim uma deficiência ao nível de desenvolvimento, das possibilidades funcionais, da comunicação, interacção social e de aprendizagem que determinam as necessidades educacionais dessas pessoas. A multideficiência sendo um factor que impossibilita o indivíduo de interagir com o meio, consequentemente, reduz as possibilidades de maturação espontânea e/ou de apropriação, ou seja, afecta todo o processo de aprendizagem e desenvolvimento através de uma interacção com a realidade quer física, quer social.

 

Para uma criança ser considerada multideficiente é necessário a realização de um diagnóstico que se torna muito delicado, na medida em que, existem várias situações de enquadramento:

 

- pessoas portadoras de deficiência mental profunda, embora apresentem outros défices associados;

 

- pessoas que exibem um comportamento adaptativo comparado com o esperado de uma pessoa com deficiência mental profunda, mas cuja causa é a deficiência ou deficiências associadas e não a deficiência mental;

 

- pessoas que poderão ser consideradas deficientes mentais profundas, mas que podem, de facto, ter como causa dominante do seu nível de desempenho em provas de inteligência ou comportamento adaptativo, uma psicose ou autismo;

 

Todavia, segundo várias pesquisas efectuadas a causa mais frequente da multideficiência é a Paralisia Cerebral, a qual prejudica a postura e a mobilidade do indivíduo. Contudo, para além desta, existem outras causas a ter em consideração, uma vez que os problemas diagnosticados se relacionam com o momento de ocorrência do problema, os agentes que afectam e a forma como actuam. Para melhor clarificar esta ideia apresentamos seguidamente o Quadro 1.

Multideficiência: causas e efeitos

Momento de ocorrência do problema

Agentes que afectam

Forma como actua

Resultado típico

 

 

 

Concepção

Translocação de pares de cromossomas no nascimento

Mudanças sérias no embrião e no feto, muitas vezes fatais.

Certos reagrupamentos dos cromossomas podem levar à Síndrome de Down e à Deficiência Mental

Erros congénitos do metabolismo como a fenilcetonúria

(lesão no cérebro da criança com graves sequelas neurológicas e mentais)

Incapacidade de efectuar processos químicos e metabólicos;

Resulta em deficiência grave ou outras complicações; pode ser revertido parcialmente quando diagnosticado cedo e administrando-se uma dieta especial.

Danos no desenvolvimento fetal;

 

Pré-natal

 

Medicamentos como talidomida

(medicamento usado como sedativo)

Medicamento usado como sedativo para a mãe que pode prejudicar o desenvolvimento normal do embrião.

Uma criança acentuadamente deformada com anomalias sérias no coração, olhos, ouvidos, membros superiores e inferiores e outras.

 

Natal

Anoxia (falta prolongada de oxigénio ao feto durante o processo de nascimento).

A falta prolongada de oxigénio pode causar destruição irreversível de células cerebrais.

Criança com Paralisia Cerebral que pode ou não ter Deficiência Mental e outras anomalias que afectam a visão e a audição.

 

Pós-natal

 

Encefalite e meningite

Doenças infecciosas (sarampo, coqueluche, entre outras) podem levar à inflamação das células do cérebro e à sua destruição.

Pode levar a uma variedade de problemas, com uma falta de tensão e a Hiperactividade; causa Epilepsia, Deficiência Mental e problemas de comportamento.

Quadro 1- Adaptado de Kirk e Gallagher (1991:416) – Educação da criança excepcional, cit. por Jesus (s/d), página web.