A braços com a Loucura. Ou melhor... Ensaiando
XLVIII
O natal havia chegado… Ou melhor… Aproximava-se… Era tempo de rever a família e regressar a casa…
Uma data santa e cristã... Comemorada por quase todos... Até ateus... Que eufóricos se tornam vitimas de uma sociedade de consumo e trocam presentes... Aumentando a economia nacional de uma forma desenfreada e absurda...
Naquele colégio… E na maioria das escolas do país… Os alunos andavam encantados… Isto porque… Ainda que… Limitados… Também eram conquistados pela estratégia das grandes superfícies para a quadra natalícia…
Uma sociedade de consumo... Onde a oferta se torna maior do que a procura... Com auxilio da publicidade... Que dá e oferece... Engana e deturpa... Padrões de vida e consciências... Mecanicamente guiadas para ilusões diminutas... A bem da banca e da finança...
Pedro… Com Martinha... Luz e Júlia… E até com a ajuda de Leontina… Conseguiram arranjar alguns presentes para os alunos… Coisas muito simples… Porém… Bastante significativas…
O comércio tradicional contribuiu… Com canetas… Blocos e porta chaves… Alguns brinquedos… Livros usados… Enfim… Tudo se arranjou… Adquiriram-se sacos decorados e guardaram-se… Para posteriormente distribuir pelas crianças e jovens…
Ao mesmo tempo… Pediram aos alunos para trazerem de casa alguns géneros alimentícios… Com esses… Fizeram um enorme cabaz de natal… Ou melhor... Um caixote de natal...
Compraram-se blocos de rifas que os mais velhos preencheram… Mais tarde… Realizaram-se arruadas e vendas… Ramos destacou-se… Pois era demasiado absorvente e conseguia ter sucesso…
As oficinas conceberam cartazes e convites para a festa… Que se distribuíram pelos discentes… Para que trouxessem os pais… Assim como… Por algumas entidades parceiras… Junta de freguesia e empresas que recebiam os alunos das áreas vocacionais externas…
A festa de final de período foi um sucesso…
Bela e Preta… Recorreram à ajuda de alguns alunos para fazer os doces e os bolos… Bem como… Irene e Dora… Que decoraram o refeitório com motivos natalícios…
Houve uma peça de teatro… Organizada por Júlia… E um coro que cantou uma canção de natal… Ensaiada pelo professor…
Luz convidou um senhor que tocava acordeon para abrilhantar a festa… Teófilo e Cláudia foram os apresentadores de serviço… Se bem que… Martinha estava na retaguarda…
No final… Ramos disse uma quadra… Qualquer coisa de amor de mãe… Menino jesus e anjinhos… Pela sua dificuldade e voz nasalada… Teve maior impacto... Houve quem se emocionasse… A sua mãe chorou…
- Está na hora! – Segredou Leontina… Batendo no ombro de Pedro…
- De quê? – Perguntou surpreso…
- Vem comigo! – Ordenou…
Seguiram ambos por uma porta lateral… Que dava para a cozinha… Pedro seguiu-a…
Ao chegar… Já lá estavam Telma e Carla…
- Tens de ser tu… - Gaguejou Telma… Segurando um fato de pai natal…
- Espero que te sirva! – Disse Carla…
Pedro nunca tinha feito de pai natal… Mas sorriu e acatou a ideia…
Colocaram umas almofadas para que este parecesse mais gordo e uma barba muito branca e grande… Uns óculos escuros tapavam os seus olhos… Ao mesmo tempo… Escutava a multidão a clamar:
- Pai natal!
Lá foi… Com um grande saco do lixo às costas… Sem muito jeito para representar… Acabou por se esmerar…
Assim que viram chegar o pai natal… A maioria dos alunos ficaram doidos e completamente excitados… Até os mais velhos…
Alguns pais e funcionários da escola… Tiveram de segurar alguns dos jovens… Como Andreia… Fábio… Tatiana… E mais…
Sónia gritava… Chorando:
- Popê!... – A verdade… É que aos olhos de Pedro… Parecia ser a única que o havia reconhecido…
Zé afastou-se para a entrada do refeitório… E Hélio batia os pulsos um no outro… De olhar desviado e estático… Talvez assustados com o momento… Cheio de ruído e confusão…
Saudade e Júlia… Fizeram um esforço para que estes se aproximassem…
O professor alterou a voz e chamou-os a todos… Um por um… Havia um saco de presentes para cada um… Decorados nas oficinas e montados com a ajuda de todos… Depois… Ainda houve distribuição de lembranças pelos pais… Um conjunto de trabalhos que os alunos tinham realizado nas salas…
Ao professor… Sensibilizou o facto de a maioria dos alunos desfrutarem do momento com muito prazer… Afinal era natal… Estavam com os amigos e a maioria até tinha consigo a família… Bebé… Cristina e Filipe… Bruninho… Sarita e Maura… Estavam encantadíssimos com o ambiente…
Por outro lado… Os pais dos clones não foram… Nem os de Mário e Ana… Nem havia ninguém da família de Sónia ou de Virgílio… Era triste… Mas… Quem sabe se não seria melhor assim… Sempre estavam mais à vontade e talvez não apanhassem vergonhas…
Para a maioria dos alunos… Aquele momento foi muito importante…
- Onde foi o professor Pedro? – Perguntou Ronaldo…
- Deve estar por aí!... – Respondeu dona Filó… Trocando com Pedro um sorriso…
Ali perto… Presa por alguém… Sónia gritava pelo seu nome:
- Popê!... Popê!... Popê!...
Samuel olhou sempre para o pai natal com um ar desconfiado… Zé beijou-o na testa quando recebeu o seu presente… Que o professor teve de lhe levar pessoalmente… Nesse momento teve a certeza de que este o reconheceu… E sem querer… Deixou que os seus olhos se molhassem...
António Pedro Santos
(Continua)...